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19 Novembro 2021 | Juliane Albuquerque

Expocine traz reflexões sobre os variados caminhos da produção audiovisual do Brasil

Dia fértil em ideias para produção AV em conversas com grandes profissionais de diversos setores do mercado

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(Foto: Márcio Neves)

O segundo dia de painéis virtuais da Expocine 2021 reuniu personalidades importantes do universo do audiovisual de diferentes esferas para discutir vários temas fundamentais para a área, que passaram por políticas públicas e regulação, adaptação de obras literárias para filmes, coprodução para novas obras, o mercado produtor de animação hoje, a importância do audiovisual na expansão da identidade nacional, as perspectivas para o mercado latino e, ainda, as tendências de novas práticas para o setor.



O painel apresentado pela Gullane Entretenimento, “A internacionalização da cultura brasileira e a contribuição do audiovisual para a expansão e proteção da identidade nacional” trouxe questões bem relevantes para a produção audiovisual sobre a valorização das nossas produções. “Os projetos brasileiros que têm fôlego para conquistar o mercado internacional com nossa cultura, porque o audiovisual tem contribui com o fortalecimento da identidade nacional. Muitas facetas da nossa cultura são mostradas nos filmes”, iniciou a mesa Fabiano Gullane, sócio-fundador da produtora. Ele ainda destacou dados significativos que devemos estar atentos ao espaço que nossas produções concorrem no mercado mundial, afinal cerca de 85% dos investimentos mundiais em audiovisual é movimentado por obras de língua inglesa. Nesses 15% que restam, cabe tudo que é produzido na Europa, Ásia, África e América Latina e é nessa fatia que o Brasil está. 

O desafio da reflexão da mesa foi: como atrair o interesse internacional para as obras brasileiras? “O Brasil é um dos protagonistas no papel de consumo de produtos audiovisuais no mundo, somos um país gigante e que consome muitos filmes e séries, geramos muita riqueza na indústria como consumidores. Mas queremos também ser protagonistas na produção de obras AV e na retenção dos direitos intelectuais”, disse Fabiano. 

Seguindo essa linha, o diretor Luiz Bolognesi falou um pouco sobre os desafios de levar os filmes à festivais internacionais e, especialmente, ser competitivo dentro do concorrido universo do Oscar – que é o sonho dele e dos produtores de chegar em 2022 com o seu documentário “A Última Floresta”, que já ganhou prêmios em festivais em Berlim, Montreal, Guadalajara e Seul. “O audiovisual tem essa potência de abrir uma janela de visibilidade de um país para o mundo. O Brasil estava nesse caminho com muitos filmes em festivais, mas foi interrompido sem política pública. A corrida para tentar concorrer ao Oscar está sendo muito difícil, sem nenhum apoio público. O filme ganhou força depois que ganhou prêmios em importantes festivais, mas mesmo assim para o Oscar é um outro patamar, requer um apoio que não temos. Seguimos tentando, tem sido um aprendizado”, contou Luiz. 

A diretora Laís Bodansky contou um pouco de sua experiência ao longo de mais de 20 anos trabalhando com cinema. “O que vivemos é essa disputa dos 15% do mercado mundial. Acho que tem várias questões, mas essencialmente fazer cinema para mim é colocar boas histórias nas telas, a gente tem que ter um bom discurso seja qual for o estilo”, disse Laís. Ela vê hoje o grande potencial das produções nacionais do audiovisual negro e LGBTQI+, que teriam bom alcance no exterior também. “Outro ponto importante é que os produtores devem buscar coprodução internacional também. Fora isso é comum. Sabemos que pode ser complexo, mas é um caminho”, disse a diretora que está estreando seu novo filme “A viagem de Pedro”, que é uma coprodução com Portugal.

Daniel Rezende, diretor de diversos sucessos no cinema como “Bingo” e “Turma da Mônica – Laços” (e em breve estreia a sequência, Lições), começou sua carreira como montador e esteve presente em filmes de grande visibilidade internacional como “Cidade de Deus”. Recentemente ele ganhou um Emmy pela série “Ninguém está olhando”, da Netflix produzida pela Gullane. Daniel acredita que a troca com o público é importante para entender os caminhos da produção. “O mundo está em um ritmo rápido, então as tendências estão difusas. O mundo quer ver histórias locais, mas também histórias universais, como foi com ‘Ninguém está olhando’. O que conta é produzir boas histórias que se conectem com as pessoas. Os temas urgentes são importantes e essenciais, o mundo quer e precisa ver! Mas acho que temos que entender que todo filme de arte também é produto e filme de entretenimento também é arte, a história tem que ser boa e levar uma faísca de interesse do que tem na nossa cultura”, afirmou Daniel.

 

Coprodução e curadoria

Tratando de coprodução de obras, tivemos a mesa da Globo Filmes, que tem um papel significativo no audiovisual brasileiro nos últimos 20 anos, desde que foi criada. Com a presença da Head da Globo Filmes, Simone Olivera e sua equipe feminina de gestão, com Caroline Rapp, Cristina Cunha, Maria Carneiro e, como moderadora, Rosane Svartman. Elas explicaram a estrutura da Globo Filmes desde o processo de seleção de obras para coprodução, acompanhamento criativo, até o plano de mídia de lançamento, já pensando em todo ciclo de vida de cada produção, do cinema até as demais janelas de exibição do grupo. “Nossos projetos visam comunicar e alcançar muita gente, mas sem deixar de fazer pensar e perder a ternura. Nós já trabalhamos com mais de 450 filmes, queremos potencializar a janela de cinema e fortalecer a cultura brasileira ampliando sua visibilidade”, disse Simone Oliveira.

Carolina Rapp contou que eles recebem projetos já formatados em roteiro, com produtora independente e com plano de recursos. “Nós recebemos cerca de 300 projetos por ano para analisarmos e selecionarmos junto com nosso comitê artístico que faz todo o acompanhamento, desde a curadoria, produção, pós-produção e entrega”, conta. Há também um diálogo com as demais janelas do grupo, como Globoplay, Globo, Canal Brasil e GloboNews, para documentários.

Todo o planejamento de marketing e divulgação também é pensado em parceria com a produtora da obra e a distribuidora. Segundo Maria Carneiro, a frente dessa área: “a gente vai além da divulgação interna, é campanha de divulgação como um todo, pensando em datas de lançamento, locais, que afiliadas programas e mídias devem ser acionadas dentro do grupo. Um bom exemplo é “Maringhella”, que conseguimos uma campanha ótima, com cross mídia no Fantástico, no Encontro e em vários espaços do grupo. O filme ainda tem uma jornada grande no cinema e depois em outras janelas”, conta Maria.

Simone Oliveira finalizou destacando a importância da janela das salas de cinema para a Globo Filmes: “O cinema é nosso sangue, nossa vida. A gente acredita na janela de cinema! Tem um interesse maior da mídia quando um filme vai para o cinema, isso potencializa o resultado das demais janelas posteriores. Os filmes que vão para os festivais são essenciais serem lançados no cinema e os populares permitem mais acesso, além de que compartilhar a experiência e essa emoção não tem igual!  A magia do cinema é única”.

 

Literatura e cinema

Ainda durante a manhã, o Estúdio Escarlate reuniu para mesa “Adaptações literárias no audiovisual”, Laura Malin (CEO da Malin Entertainment), Joana Henning Generoso (CEO do Estúdio Escarlate) e o escritor Fabrício Carpinejar, com a moderação de Gisele Vitória, diretora de comunicação do Escarlate. A conversa lembrou da importância dos livros na história do cinema, já que desde sempre estão presente em grandes adaptações para filmes de sucesso como “O Poderoso Chefão”, “O Iluminado”, “Tubarão”, “A Lista de Schindler”, entre outros.

Joana contou como o período de pandemia, especialmente em 2020, serviu para uma grande pesquisa de conteúdo literário para a Escarlate. “No momento que a gente não pode produzir/gravar em 2020, nós fizemos um mergulho em histórias da literatura para pesquisar bons conteúdos. Pesquisamos muito dentro da nossa cultura. Imergimos em conteúdo e licenciamos sete livros para adaptar e teremos o último livro do Carpinejar. O livro conduz o leitor e o cinema apresenta a imagem. É um desafio muito gostoso”, disse Joana.

Laura Malin, que tem ampla experiência em adaptação de obras e atuação no Brasil e em Los Angeles, falou como descobriu o livro de Carpinejar ‘Minha esposa tem a senha do meu celular’. “Estava no aeroporto, comprei e li antes do voo e fiquei impactada com as ideias de relacionamento que o livro traz. Fiquei com esse conteúdo na cabeça e encontrei a Escarlate que estava interessada, eles dão espaço a narrativas que não têm espaço em outros locais”. Para Carpinejar será a primeira vez que terá um livro levado para o cinema. “Tive essa ambição de mostrar o lado mais sincero e modesto dos relacionamentos e é uma história com reviravoltas internas, de evolução de consciência nas relações”, revela o escritor.

 

Inovações e perspectivas

Uma conversa que tocou em novos olhares para as produções foi realizada pelo pessoal da Transformação Audiovisual, intitulada “Novas práticas e tendências de negócio para potencializar a criação e o impacto na exibição” com a presença de Ana Carolina Lima, Head de conteúdo da Globoplay; Fábio Lima, CEO da Sofá Digital e a produtora Malu Andrade, da Coração da Selva, tendo mediação de Dani Talomei e Leonardo Edde, ambos da Transformação Audiovisual. Eles levantaram a importância de considerar os espectadores fãs na hora de pensar a produção de conteúdo audiovisual.

“Vivemos uma mudança de cultura que temos que ter também em produção. Para pensar novas formas de captar recursos. Todo mundo fala de fãs, likes e seguidores nas redes sociais, mas sabemos que eles são essenciais em todas as mídias, mas não são tão usados no mercado do AV. Como produto e negócio, temos que pensar que pode ser interessante produzir material voltado para esse público que pode gerar retorno certo”, disse Leonardo.

Carolina contou como a Globoplay tem um relacionamento próximo com seu público e o quanto isso tem influenciado nas decisões e produções da plataforma. “É um serviço direto para o consumidor então a gente se relaciona diretamente com eles nas redes sociais, o feedback é constante e profundo. Há troca de ideias e o conteúdo é pensando e voltado por base desse desejo dos dos fãs do Globoplay – como por exemplo resgate de novelas mais antigas”.

Fábio contou que a Sofá Digital também se baseia muito no feedback online para suas ações. “A nossa ideia é ‘resolver o problema’ do espectador, temos mecanismos que analisam as palavras-chave na busca de conteúdo, o que querem. Aí a gente analisa e classifica essa busca e tendências pelos conteúdos independentes”. Ao final da conversa, a Sofá e a Transformação apresentaram uma parceria que vai gerar uma novidade, uma maratona de criação pensada nesse perfil onde os fãs são o objetivo, a Filmakathon que acontecerá em 2022.

Já o painel da Olsberg “Perspectivas para a indústria AV na América Latina na pós-pandemia” reuniu profissionais do setor de vários setores e países latinos para debater sobre ideias e possibilidades para a região. Contou com Leon Forde (Olsberg•SPI/London), Enrique Avogadro (Ministro de Cultura da Cidade de Buenos Aires), Carla Sanchez (Motion Picture Association-MPA/Cidade de Mexico), Maria Fernanda Céspedes (Federação Ibero-americana de Academias de Artes e Ciências Cinematográficas-FIACINE/Bogotá) e como moderador, Steve Solot (Olsberg•SPI/Rio de Janeiro).

Enrique Avogrado falou da experiência que teve em Buenos Aires e como acredita na retomada do setor. “Um dos aprendizados da pandemia, é o crescente consumo virtual. Mas as pessoas também estão voltando com entusiasmo às salas de cinema daqui. A Argentina fechou por muito tempo para quarentena e o setor cultural foi um dos que mais sofreu no país. Temos uma cinegrafia própria que precisamos retomar com força porque gostamos de contar nossas narrativas. Por isso, estamos com diversas iniciativas de fomento para a retomada, como de incentivo financeiro, uma incubadora de projetos para criação de séries, alívio fiscal para salas de cinema e estudando sobre a inclusão de um programa de cash rabate como já se aplica no Uruguai e em São Paulo.

Leon Forde, com base nos estudos realizados pela SPI acredita no potencial da região. “Tem empresas que estão movimentando muito $ no setor em escala global. Os governos regionais têm que ver o potencial de retorno que esse mercado pode trazer, que impacta vários outros setores econômicos dos lugares. Para uma região que está em dificuldades econômicas é uma alternativa muito interessante e positiva”, afirmou.

 

Desafios dos filmes de animação

O painel voltado para as animações foi “Os desafios e oportunidades do “work for hire” nas animações audiovisuais” e trouxe Alessandra Meleiro (Iniciativa Cultural), Felipe Tavares (Copa Studio), Kiko Mistrorigo (TV Pinguim) e Jonas Brandão (Split), com a moderação de Cesar Coelho (Campo4). Cesar abriu o papo lembrando do ciclo virtuoso que a animação brasileira vinha alcançando nos últimos anos, com muitas premiações internacionais, inclusive no maior festival do setor, o Festival Internacional Annecy. “Estávamos vivendo anos de crescimento vertiginoso, entrando no mercado internacional pela porta da frente com a nossa cultura e capacidade criativa. Agora estamos num momento de grande desafio de manter nossa boa estrutura depois da crise que veio com a pandemia e a falta de incentivos”.

O ‘work for hire’, ou prestação de serviço, é uma via que os estúdios sempre se utilizaram, mas que tem sido uma possibilidade de manutenção em tempos que as produções próprias estão difíceis de serem realizadas. Jonas, da Split, trabalha bastante como prestador de serviço, “tem sido nossa principal atividade atualmente e tem sido um aprendizado esse contato com estúdios internacionais”, contou.

Já Kiko, que está no mercado de animação há muitos anos, acredita na importância dos conteúdos próprios e independentes, mas também se interessa pela coprodução internacional e na necessidade do work for hire, só salienta a necessidade de cuidado nas negociações “Temos problemas de câmbio e de valor e temos que lutar contra isso. Nos dão orçamentos injustos às vezes e estamos em um momento frágil porque ainda não há regulação nos streamings, por exemplo. VOD não paga imposto no Brasil, na França se paga 24% e vai para as produções francesas... Temos que lutar por isso”.

 

Ancine: a importância da janela de cinema e os próximos desafios

 

O Diretor-presidente da ANCINE, Alex Braga Muniz abriu o dia da versão virtual da Expocine 2021 exaltando o nosso audiovisual e reafirmando que agora é “tempo de cinema”. Nomeado no cargo em outubro, depois de um período como substituto desde 2019, Alex apresentou quais são os desafios e intenções para o próximo ano da Agência Nacional do Cinema, que está vinculada à Secretaria de Cultura do Governo Federal.

Alex ressaltou a importância econômica do audiovisual brasileiro: “O setor tem demostrado o potencial da indústria. Além de estratégico, é uma bela oportunidade de crescimento de um novo ciclo da economia brasileira. Com transformações e inovações tecnológicas, boa parte do potencial vem da criatividade e inteligência pessoal, mas também da capacidade de inovações tecnológicas”, afirmou. Ele disse também que neste período em que aos poucos vamos superando a pandemia, vamos iniciando um novo ciclo de retomada para vencer desafios da política pública no setor.

“A palavra de ordem nessa retomada é o cinema. É tempo de retomarmos as políticas públicas do audiovisual. É importante a uma relação entre produtores, distribuidores e exibidores (que andam juntos). Temos o foco também na abertura e manutenção das salas que são fundamentais para o público que consome o cinema brasileiro. O parque de exibição sofreu muito durante a pandemia de covid-19. Estamos também iniciando os trabalhos com discussões e debates sobre mecanismos de incentivo à produção cinematográfica e de exibição, e realizamos ações emergenciais realizadas durante a pandemia”.

Outro tema importante dito por Alex Braga foi em relação a regulamentação do setor de streaming no país. “O próximo passo sem dúvida é a regulação dos serviços de streaming. É preciso enfatizar as salas de cinema como 1ª janela, portanto as obras brasileiras de longa-metragem devem passar primeiro nos cinemas antes de irem para o streaming. De um lado, a garantia da produção de novas obras na garantia de direitos de propriedade e para as pessoas possam se identificar nas obras. A Ancine vai compartilhar informações e dados nesse período de pensar a regulação do streaming”.

 

 

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