CEO da UNIC exalta a pluralidade europeia como principal força do mercado
17 Julho 2019 | Fernanda Mendes e Renata Vomero
Uma das associações voltadas ao mercado de cinema mais importantes do mundo, a UNIC (Associação Internacional de Cinemas), que atua auxiliando o território europeu, enfrenta os novos desafios da exibição e se prepara para os que vêm pela frente. Sendo capitaneada, desde 2017, por Laura Houlgatte, que antes exercia a função de Executiva de Assuntos Europeus, a UNIC precisará se encontrar nos novos caminhos que se abrem na Europa com as transformações advindas com as eleições na União Europeia, as mais polêmicas dos últimos 40 anos, já que envolveram questões como a negociação do Brexit, o fortalecimentos dos partidos ultranacionalistas, que apoiam a separação da União Europeia, e a enorme onda de conservadorismo que vem se fortalecendo no mundo inteiro.
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Apesar de o resultado dessas eleições não terem modificado muito o quadro que já vinha se consolidando, ele trouxe um maior multipartidarismo entre as cadeiras que representam cada Estado-Membro da União, com isso, os deputados que fazem parte deste novo Parlamento Europeu precisarão colocar suas habilidades diplomáticas à mostra para conseguirem criar fortes coalisões dentro do parlamento. Tudo isso, claro, deve respingar no setor audiovisual da Europa e é aí que a UNIC está de olho. “Os deputados são divididos entre comissões especializadas, que instruem propostas legislativas e nomeiam uma equipe de negociação para conduzir as conversas com o Conselho e a Comissão Europeia sobre a legislação da UE. Para nós da UNIC, os Comitês mais importantes são: Cultura e Educação (CULT), Assuntos Jurídicos (JURI) Indústria, Pesquisa e Energia (ITRE) e Mercado Interno e Proteção do Consumidor (IMCO)”, explica Houlgatte. As transformações ainda não acabaram, o novo Parlamento deverá indicar o Presidente da Comissão Europeia, que é quem escolhe os membros das comissões que vão cuidar destas pastas específicas, ou seja, ainda tem muita coisa a se prestar atenção pelos próximos meses.
Com o multipartidarismo mais evidente nesta nova formulação, pelos próximos cinco anos – tempo até as próximas eleições - novos grupos entram no jogo de poder na União Europeia, o que preocupa a UNIC, já que agora aqueles que apoiam o mercado de cinema estão mais divididos. “Tradicionalmente, o Grupo ECR (Conservadores e Reformistas) tende a ser favorável ao setor de direitos autorais. O Grupo S&D (Socialistas e Democratas) geralmente dá mais apoio aos aspectos culturais e sociais do nosso setor, enquanto o Grupo do PPE (Partido Popular Europeu) apoia as nossas contribuições econômicas. No entanto, os Verdes e o grupo Renovar Europa (Liberais e Democratas) estão mais divididos - alguns deles apoiam os princípios que defendemos, alguns deles não”, ela comenta. E são justamente estes últimos partidos os que mais cresceram em representatividade nessas eleições, principalmente o grupo dos Verdes, que conquistaram quase 20 cadeiras a mais do que na última eleição para a Eurocâmara.
A UNIC, então, coloca como prioridade o estreitamento das relações com esses novos políticos e a necessidade de lhes apresentar a importância da indústria como um todo. “Com as eleições que acabaram de acontecer e o novo Parlamento entrando em atividade este mês, o nosso principal objetivo é chegar aos membros o mais rapidamente possível para comunicar o valor social, econômico e cultural do cinema hoje em dia e a natureza crucial dos modelos de negócio de longa data em que o setor é construído. Por exemplo, publicamos recentemente o nosso Manifesto, que descreve as nossas principais prioridades políticas e os impactos extremamente positivos que os cinemas têm em toda a UE”, exemplificou a executiva.
Outro ponto trazido pela profissional como desafio frente à União Europeia é o fato de que cada país tem uma prioridade diferente quando se trata de mercado de cinema e esses interesses estarão sendo representados de acordo com essas prioridades. “As diferenças em termos de prioridades numa base de país a país devem ser levadas em consideração, dado que alguns Estados-Membros atribuem maior valor ao nosso setor do que outros”, afirmou Laura.
Lidar com essa diversidade, no entanto, não é novidade para a UNIC que cobre mais de 38 territórios em toda a Europa, ainda assim, a associação encontra nessa pluralidade a maior peculiaridade do cinema europeu. “É uma ampla gama de mercados, cada um com suas especificidades em termos de práticas da indústria e gostos de audiência. Dito isto, há mais que nos une do que nos divide. Os cinemas de todos os nossos territórios atribuem igual importância à exclusividade, aos direitos autorais, à inovação no sentido de oferecer a melhor experiência de cinema possível - uma marca registrada de nossa indústria - e a um apetite do público extremamente saudável por uma ampla gama de conteúdos em cinemas grandes e pequenos”, anima-se a profissional, que entrou em 2018 na lista das 50 Mulheres do Cinema Global da Celluloid Junkie e recentemente na lista de Mulheres que Moldam Bruxelas (onde é sediada a UNIC), do jornal Politico.
Essa questão de gênero, inclusive, é uma preocupação tanto para a UNIC, quanto, claro, para Laura, que vê com otimismo o progresso quanto à questão de igualdade de gênero na indústria. Pensando nisso, a UNIC, inclusive, lançou o Programa de Liderança de Mulheres no Cinema, uma iniciativa de mentoria de 12 meses para mulheres na exibição de cinema. Em sua terceira edição neste ano, o programa vem recebendo mais incentivos de todos os setores dentro da indústria, o que contribui muito para que exista mais mulheres no mercado.
Streaming
Uma grande polêmica neste ano foi a maior presença dos filmes lançados em streamings dentro dos festivais e premiações. Tal movimentação gerou fortes protestos por parte de exibidores e a própria UNIC se manifestou contra essas plataformas no Festival Internacional de Berlim. No entanto, Laura Houlgatte parece mostrar uma postura um pouco mais flexível agora quanto a estas possibilidades de janela de conteúdo. “Nós, da UNIC, acreditamos firmemente que os cinemas e as plataformas legais de streaming podem não apenas coexistir, mas, de fato, se complementarem. Pesquisas mostram que muitos dos frequentadores de cinema mais recorrentes também são consumidores significativos de filmes on-line. E os operadores de cinema dão as boas-vindas a todos que tragam conteúdo de qualidade para suas telas, como comprovam as centenas de novos filmes que são lançados todos os anos nos cinemas da Europa. Mas acreditamos que os interesses do público e da própria indústria cinematográfica são mais atendidos com a existência de uma ‘janela’ clara e sustentável entre o lançamento de um filme nas salas de cinema e em outras plataformas”, salientou.
E quanto ao futuro? Bom, essa é uma questão que empolga a executiva: “Diante de desafios potenciais, o setor continua a prosperar e é impulsionado por oportunidades de crescimento adicional em mercados emergentes em toda a região. Desempenhos recordes no ano passado em regiões como Reino Unido, Polônia e Turquia, juntamente com desempenhos fenomenais nos Países Bálticos e crescimento contínuo na Europa Central e Oriental e nos Bálcãs, mostram um quadro extremamente positivo para nossa indústria e estamos trabalhando para garantir prosperidade nos próximos anos”, finalizou.
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