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24 Março 2023 | Yuri Codogno

Estudo aponta como indústria audiovisual influenciou na economia do Brasil em 2019

Análise foi encomendada pela MPA ao Oxford Economics para reforçar a importância do audiovisual para o Brasil

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(Foto: iStock)

O ano de 2023 tem sido reconfortante para os diversos segmentos da indústria audiovisual brasileira, com muito mais lançamentos do que os três anos anteriores. Não que esteja fácil para alguém, mas produção, distribuição e exibição agora conseguem vislumbrar um futuro mais autossustentável para o setor. 

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A pandemia, como todos nós estamos cansados de saber, afetou a indústria de uma maneira nunca vista antes e, aos poucos, o audiovisual vem recuperando sua força. A meta é voltar para o ritmo de crescimento que o setor estava tendo em 2019, último ano da pandemia e um dos melhores já registrados em números no Brasil. Mas isso nos leva a uma questão: que valores são esses tão bem falados pelos profissionais, mas que raramente são postos na mesa?

A Motion Pictures Association (MPA) no Brasil encomendou ao Oxford Economics um estudo - nomeado de A Contribuição Econômica da Indústria Audiovisual do Brasil em 2019 - que detalhou como o setor impactou positivamente, em números, no PIB (Produto Interno Bruto) nacional de 2019. A ideia, porém, não é comparar o antes com o agora, até porque sabemos que infelizmente ainda há muito a se recuperar. Pelo contrário, o objetivo é mostrar como, em um futuro próximo, o setor ainda pode voltar a ser uma boa influência na economia local e deve ter o olhar atento de autoridades públicas e investidores. 

“O objetivo é compartilhar com a sociedade civil, mercado, e tomadores de decisão, com base em dados concretos, a importância da indústria audiovisual para a economia brasileira”, ressaltou Andressa Pappas, diretora de relações governamentais para o Brasil da MPA.  

O PIB do Brasil em 2019, segundo o IBGE apurou na época, foi de aproximadamente R$ 7,3 trilhões. Esse é o valor do lucro somado de todas as atividades econômicas que aconteceram legalmente em território nacional nos 12 meses de 2019. Considerando apenas o PIB total da indústria audiovisual brasileira, a arrecadação foi de R$ 55,8 bilhões em 2019, representando cerca de 0,75% do PIB daquele ano.

Para chegar a esse valor, é preciso antes descrever como é feita essa arrecadação, que é dividida em: direta (uma empresa emprega funcionários e gera PIB e arrecadação de impostos para as autoridades); Indireta (também há gasto monetário com fornecedores que empregam funcionários, geram PIB e pagam impostos, que, por sua vez, trabalham com outros fornecedores); e induzida (os funcionários, incluindo os dos fornecedores, gastam seus salários em setores gerais da economia, gerando mais PIB, empregos e arrecadação de impostos).

Em 2019, a indústria audiovisual arrecadou diretamente R$ 24,5 bilhões, indiretamente mais R$ 18,8 bilhões e R$ 12,5 bilhões de maneira induzida. Desses valores, o governo lucrou em impostos, respectivamente, R$ 3,4 bilhões, R$ 2,6 bilhões e R$ 1,7 bilhão. Considerando apenas a arrecadação direta, a porcentagem de contribuição cai de 0,75% para 0,33%.

Em um primeiro olhar, tanto 0,75% quanto 0,33% podem parecer números minúsculos. Mas é preciso levar em consideração duas coisas: existem centenas de diferentes setores que influenciam diretamente na economia nacional; e que o segmento de audiovisual não está na base da pirâmide de necessidades básicas, como alimento, roupas e afins. Portanto, chegar a quase 1% do PIB interno nacional é algo grandioso. 

Em termos de comparação, o gigantesco setor de telecomunicações - que engloba a parte industrial, telefonia fixa, telefonia móvel, banda larga fixa, tv por assinatura (que converge com o setor audiovisual), trunkings e todos seus derivados - obteve uma receita total de R$ 244 bilhões em 2019. Isso representou pouco mais de 3% do PIB, lembrando que é um segmento da base da pirâmide, ou seja, se faz necessário no dia a dia das pessoas. Essas informações foram retiradas do estudo Desempenho do Setor de Telecomunicações de 2019, da Telebrasil.

Voltando ao audiovisual, o estudo da MPA destaca que “os estúdios de produção, as operadoras de TV, as plataformas de streaming e os cinemas são responsáveis por contribuições diretas importantes, e geram impactos indiretos significativos por meio da compra de bens e serviços de fornecedores nacionais, induzindo ainda mais atividade econômica, ao pagar e dar suporte a salários e remunerações ao longo da cadeia de fornecimento”.

“Somos um setor muito relevante para o país, não só do ponto de vista criativo, identitário e cultural, mas também por contribuirmos, significativamente, para a geração de empregos, arrecadação de tributos, qualificação profissional, desenvolvimento tecnológico e inúmeros processos inovadores”, completou Andressa.

Outros números que corroboram para a afirmação acima é a quantidade de pessoas que o audiovisual emprega. Em um total de 657 mil funcionários, 126,5 mil são diretos, 303,9 mil indiretos e 226,4 mil induzidos. Desta forma, para cada emprego direto do setor, outras 4,2 pessoas são empregadas através da cadeia de suprimentos e dos gastos induzidos por salários. Em outros termos, para que uma pessoa tenha emprego no audiovisual, outras quatro precisam ser mantidas em vagas de fornecedores, que por sua vez também gastam seus salários em outros segmentos.

E isso também nos leva a outros números: se para cada funcionário do setor 4,2 pessoas são empregadas indiretamente ou de maneira induzida, qual o retorno financeiro que o audiovisual gera? A proporção, segundo o estudo, implica em um fator multiplicador de 2,3. Isso significa que, para cada real investido, há um retorno adicional de R$ 1,3. Então se são investidos R$ 10 milhões, o retorno total (que influencia no PIB) é de R$ 23 milhões. R$ 10 bilhões, por exemplo, viram R$ 23 bilhões e por aí vai.

Outra informação revelada pelo estudo é que a média de contribuição direta para o PIB por funcionário do audiovisual foi de R$ 193,4 mil em 2019. Segundo o estudo, isso significa que o profissional desse setor contribui mais anualmente do que a média nacional, que é de R$ 60 mil. Isso indica que os funcionários da indústria audiovisual são três vezes mais produtivos (em termos de arrecadação para o PIB nacional) que a média dos funcionários no Brasil.

“Vale notar que o estudo da Oxford Economics baseia-se em dados de 2019 por este ser um ano típico para a indústria audiovisual. A pandemia de Covid-19 trouxe distorções profundas à economia e, por isso, os anos de 2020 a 2022 não nos ofereceriam o retrato fiel do que ocorre no setor. Além disso, 2019 oferece uma linha de base mais consistente para analisarmos as mudanças pós-pandemia”, lembrou a executiva.

 

Contribuição por segmento

Se o setor contribuiu com um total de R$ 55,8 bilhões para o PIB de 2019 e empregou diretamente 126,5 mil pessoas, é importante saber também quais foram as contribuições dos diferentes segmentos audiovisuais. A intenção não é dizer se um foi ou é mais importante do que o outro (até porque acontece uma codependência entre si), mas sim demonstrar o potencial de cada um.

Sem nenhuma grande surpresa, a TV aberta foi quem mais contribuiu e empregou pessoas diretamente: R$ 22,2 bilhões (R$ 9,3 bilhões diretos) e 61.130 funcionários. Na sequência, vem a TV por assinatura, com R$ 19,2 bilhões (R$ 9,1 bilhões diretos) e 9.480 empregos. Juntas, as televisões foram responsáveis por incríveis 74,1% da arrecadação total da indústria audiovisual e por 55,8% dos empregos diretos do setor. 

A indústria de VoD, por sua vez, é a terceira que mais arrecadou, com R$ 4,7 bilhões (R$ 2,4 bilhões diretos), porém a que menos empregou diretamente: 3.460 funcionários. Há muitas razões para isso, como o motivo de ser um segmento que, muitas vezes, apenas uma pessoa ou um pequeno grupo de pessoas produzem muitos conteúdos rentáveis, como acontece no Youtube. As plataformas de streaming, por sua vez, ainda estão aprendendo a obter lucro, mas, para funcionarem, dependem um efetivo menor de funcionários trabalhando do que as televisões, por exemplo. 

Entretanto, aqui vale destacar que o serviço de VoD teve um enorme boom durante a pandemia, então tais números de 2019 são, provavelmente, os mais defasados entre todos os segmentos. Desta forma, é um pouco difícil chegar a uma conclusão que explique exatamente os valores de vídeo sob demanda.

A própria pesquisa ressalta que o número de usuários de SVOD (VoD, mas depende do pagamento de uma assinatura, como Netflix) no Brasil pode aumentar de 15,9 milhões em 2019 para 36,2 milhões em 2025. Em 2021, por exemplo, a Netflix teve a maior participação no mercado, com 32%, seguida pela Amazon Prime com 26% e Globoplay com 10%.

Entrando agora mais diretamente no segmento de cinema, a exibição foi a quarta que mais arrecadou, com R$ 4 bilhões (R$ 1,7 bilhão diretos), mas a segunda que mais empregou: 27.050. Aqui não é muito difícil compreender, visto que o funcionamento de cinemas exige muitos funcionários, que podem se dividir na projeção, atendimento, bombonieres, programação, comercialização, comunicação, limpeza e muito mais. Agora multiplique essa quantidade de funcionários pelos 852 complexos que o Brasil tinha em 2019 (segundo o Anuário do Cinema Brasileiro da Ancine de 2019) e verá o número crescendo exponencialmente. 

Aliás, esse segmento muito provavelmente tenha sido o que mais sofreu com a pandemia. De acordo com o Anuário do Cinema Brasileiro da Ancine de 2021, lançado em novembro do ano passado, o número de complexos havia caído para 766. Apesar de 2022 ter apresentado uma visível melhora em relação a 2020 e 2021 (os números só serão disponibilizados no final deste ano), é 2023 que tem dado um respiro maior aos exibidores.

A produção e distribuição de filmes e de TV vem na sequência, com arrecadação de R$ 3,7 bilhões (R$ 1,6 bilhão diretamente) e 17.600 empregos diretos. Aqui, o que chama mais atenção é que é o único segmento audiovisual que a arrecadação direta é maior do que a indireta (R$ 1,2 bilhão) e a induzida (R$ 0,9 bilhão).

O próprio estuda ressalta, porém, que este é outro segmento que a pandemia modificou e que o cenário atual é bastante diferente: “embora esses resultados sejam relativos ao ano de 2019, é importante sublinhar que o cenário de produção de filmes e TV hoje é consideravelmente diferente, graças aos investimentos privados feitos pelas plataformas de streaming e pelos programas de incentivo”. 

Um dos efeitos favoráveis da pandemia, segundo o estudo, foi o impacto positivo no crescimento de plataformas de streaming e o interesse das plataformas mundiais pelo mercado brasileiro, que possui mais de 200 milhões de pessoas. Nesse aspecto, as grandes empresas mundiais têm que enfrentar a concorrência da Globoplay, a plataforma de streaming do gigante grupo Globo, que produz conteúdo brasileiro: novelas e outras séries são feitas internamente, dentro do país.

Além disso, na análise do mercado, os últimos quatro anos foram extremamente complicados para a produção, graças aos cortes que a cultura e o setor audiovisual sofreram. Então, com uma nova política vigente, as entidades esperam uma forte recuperação na produção e, quem sabe, até a implementação na cota de tela nacional, que em efeito cascata à médio e longo prazo, poderá aumentar exponencialmente a arrecadação do segmento.

Por fim, a comercialização e reprodução foram responsáveis por R$ 2 bilhões (R$ 0,5 bilhão diretos) da arrecadação, empregando 7.860 diretamente. Este segmento engloba as empresas cuja atividade principal é a venda ou aluguel de DVDs, discos Blu-ray e outras mídias físicas contendo material audiovisual para os consumidores. Nos últimos anos, essa parte da indústria sofreu um declínio em decorrência da chegada de novos modelos de negócios, como o VoD. O crescimento da pirataria também contribuiu para a queda nas vendas e locações de mídia física.

 

Outros impactos e informações sobre a indústria audiovisual

Segundo o estudo, o setor audiovisual também contribuiu para a economia e a cultura brasileira de inúmeras outras formas. Entre os citados, estão: atração de turistas nacionais e estrangeiros que desejam ver onde seu filme/programa de TV favorito foi filmado; a arte, artistas e mídias brasileiras por meio da promoção de festivais nacionais e internacionais; novas rendas e fluxos de tributação por meio da utilização da infraestrutura natural e econômica existente no país e também estimulando o desenvolvimento de novas infraestruturas; e patrocinando programas de treinamento voltados a orientar jovens brasileiros nas carreiras do setor audiovisual e ensinar novas habilidades para brasileiros que já trabalham na indústria.

Apesar disso, uma outra chamou atenção: a venda de conteúdo audiovisual produzido localmente para plataformas internacionais e/ou outros clientes, promovendo a cultura brasileira no cenário mundial. Essas exportações subiram 10% em termos reais entre 2019 e 2020, sustentado pela forte depreciação da moeda brasileira frente ao dólar. Em 2019, as exportações de serviços da indústria audiovisual totalizaram R$ 901 milhões (ou R$ 1,1 bilhão nos preços de 2020).

O foco aqui está principalmente no potencial, porque nos últimos dois anos foram anunciadas - incluindo pelas majors - uma maior participação na produção de conteúdo local original, aumentando a quantidade de grandes produções brasileiras. Além disso, como citado, há grandes expectativas para a implementação da cota de tela para filmes brasileiros nos cinemas. Somadas, essas duas novidades podem fazer crescer exponencialmente a venda de conteúdo original para o exterior.

O estudo usa como exemplo a série 3%, primeira produção seriada brasileira original da Netflix (em parceria com a Boutique Filmes) e o primeiro programa de TV em português a obter sucesso mundial fora da América do Sul e de Portugal. Mais da metade do seu público era de fora do Brasil, demonstrando o quanto as produções nacionais têm potencial de gerar grandes receitas de exportação. Outros exemplos citados foram as animações Tromba Trem, Harry Hairy Cowboy e Irmão do Jorel.

De lá para cá, outras produções originais nacionais dos principais streamings foram lançadas, como os sucessos Bom Dia, Verônica, Cidade Invisível, Democracia em Vertigem e Coisa Mais Linda (Netflix), Sentença, Dom, Impuros, Lov3 (Prime Video), Júpiter, Procura-se e Vale dos Esquecidos (HBO Max), além de outros streamings e também da Globoplay, que há anos lança conteúdo original de qualidade. Sem contar os lançamentos nacionais de sucesso nos cinemas, como os dois longas da Turma da Mônica, Marighella, Eduardo e Mônica e Medida Provisória.

As exportações também nos levam à balança comercial de serviços audiovisuais, que se tornou positiva em 2019 e 2020. Desta forma, o Brasil exportou mais serviços audiovisuais do que importou nesses dois anos. De acordo com os dados da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), as exportações brasileiras subiram 10% em termos reais entre 2019 e 2020 sustentadas, novamente lembrando, pela forte depreciação da moeda brasileira frente ao dólar. 

Entretanto, a pesquisa também trouxe um ponto controverso e que há anos levanta discussão: segundo a Frontier Economics, as fortes restrições políticas diminuem as exportações de transmissões televisivas e estão associadas a um menor investimento em conteúdo. Aqui, o estudo levanta que políticas protecionistas (idealizadas para proteger as empresas nacionais da concorrência estrangeira) podem resultar em indústrias locais fechadas para o mercado e de qualidade inferior, com menor capacidade para produzir o tipo de conteúdo que é exigido em nível global. 

O estudo da Frontier observou que níveis de protecionismo maiores (por exemplo, a instituição de cotas de tempo de transmissão) levam a quedas nas exportações dos programas, sugerindo que as nações protecionistas são menos capazes de monetizar seu conteúdo em mercados estrangeiros ou de promover sua cultura para espectadores em todo o mundo.

Apesar disso, como foi apontado mais acima, de 2019 para cá, muitas empresas seguiram pelo caminho contrário, aumentando o investimento na produção original nacional, indicando que, talvez, o público esteja ansioso por mais conteúdo brasileiro. Assim, é necessário observar como o mercado consumidor reagiu desde o início da pandemia para cá e se houve um aumento da exportação nacional durante esses anos.

Internacionalmente, muitos países possuem políticas culturais destinadas a promover a produção local. Dois dos maiores exemplos são a França, que há anos impulsiona o próprio cinema com cotas de tela, e a China, que ano a ano vem concorrendo com os EUA como o principal mercado consumidor de cinema, mesmo com seus filmes sendo exibidos quase que exclusivamente apenas em território nacional.

A pesquisa defende, por sua vez, que “ao ajustar sensivelmente as intervenções políticas para incentivar o investimento, o Brasil poderia desfrutar de amplos benefícios, como novas vagas de emprego, maior atividade econômica, aumento das exportações, profissionais mais competitivos e uma infraestrutura industrial expandida. Tudo isso, por sua vez, gera um cenário ideal para atrair novos investimentos. Portanto, as autoridades governamentais devem buscar uma combinação equilibrada de políticas, mantendo-se atentas às possíveis consequências não intencionais do protecionismo que pode causar uma redução do investimento, da atividade econômica e das exportações, e ainda incentivar a pirataria digital”.

 

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