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Artigo / Acessibilidade

15 Junho 2021

Cinemas Acessíveis: contagem regressiva para a adaptação das salas de exibição*

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Já estamos em junho de 2021 e dezembro chegará num piscar de olhos. Com a população vacinada, as pessoas retornarão aos cinemas e a vida seguirá o “novo normal”. É o que todos nós do setor audiovisual esperamos. E torço para que as atividades culturais sejam retomadas o quanto antes.



Está terminando o prazo, determinado pelo governo, para que todos os exibidores preparem as suas salas de cinema para receber pessoas com deficiência. Um público de muitos milhões e que deve merecer especial atenção dos executivos, já que se trata de formação de plateia, um expressivo número de consumidores de salas de cinema.  No mundo atual, onde estima-se perda significativa de consumidores a partir da aceleração do consumo por plataformas, olhar para esse nicho pode representar o preenchimento dessa “lacuna” de consumo.

Segundo relatório da ANCINE, de 2019, a maioria dos complexos já oferece assentos especiais para cadeirantes, pessoas obesas e pessoas com mobilidade reduzida. Para os cadeirantes, por exemplo, 95% do parque exibidor já está equipado com assentos adaptados. Para pessoas obesas ou com mobilidade reduzida, o percentual é de mais de 60%.

Já no que se refere à acessibilidade audiovisual, ainda há o que percorrer nos próximos meses. Hoje, aproximadamente 45% das salas contam com equipamentos de tecnologia assistiva para que pessoas com deficiência visual e auditiva consigam ter acesso a filmes brasileiros ou estrangeiros com os recursos de audiodescrição, janela de Libras ou legendas descritivas.

Sempre bom relembrar que a Lei Brasileira de Inclusão, de 2015, prevê que os cinemas devem reservar espaços livres e assentos para a pessoa com deficiência, bem como para o seu acompanhante, e todas as sessões devem contar com acessibilidade audiovisual em filmes brasileiros ou estrangeiros.

Olhando para um cenário em que as salas estarão 100% acessíveis, o que esse público valoriza para frequentar o seu estabelecimento?

Em outubro de 2019, a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo publicou o estudo

O Varejo e o Consumidor com algum tipo de deficiência física. O estudo, que também engloba pessoas com deficiência visual e auditiva, teve como objetivo quantificar aspectos relacionados aos hábitos de compra de quase mil consumidores com deficiência, com especial interesse na comparação entre lojas físicas e online.

Destaca-se aqui o fato de que os consumidores com deficiência movimentam cerca de 5 bilhões de reais anuais, segundo a Fundação Getúlio Vargas (SP). Ainda assim, nos deparamos com a inadequação de grande parte da indústria, que simplesmente esquece esse público.

Um outro aspecto do estudo, e que pode ser transposto para o cenário das salas de cinema, é que 16% das pessoas com deficiência frequentam shoppings uma vez por semana, 23% quinzenalmente e 29% mensalmente. Considerando que 88% das salas se encontram em shoppings, é um público em potencial e que deve ser cativado. E, ainda, para essa atividade de lazer, não vão sozinhos: 100% estão acompanhados de familiares ou amigos, que os ajudam em suas compras.

Segundo a pesquisa, na visão das pessoas com deficiência, três fatores são fundamentais e influenciam a escolha por um determinado estabelecimento:

  • Facilidade de acesso: para 89% faltam placas em Braille, pisos táteis e a entrada dos shoppings são fatores que dificultam o acesso.
  • Qualidade no atendimento: para 70% falta educação, qualidade e qualificação no atendimento a pessoas com deficiência.
  • Atenção no atendimento: para 76% dos entrevistados faltam atendentes que possam ajudar em algumas tarefas, como ler preços ou descrever produtos.

O exibidor já está perto desse público, nos shoppings, e já possui salas e filmes acessíveis. Diante dessas demandas, existe, portanto, a tarefa de criar estratégias para atrair e manter esses consumidores e que se torna necessária e urgente.

Há a parcela dos exibidores que ainda precisa equipar suas salas até janeiro de 2022 e que, muitas vezes, necessita de financiamento para comprar os equipamentos, o que não é simples. Nesse caso, o governo, por meio da ANCINE, deveria agir.

São obrigações que demandam investimento, tempo e planejamento para serem postas em prática. No entanto, olhando para o futuro, as salas adaptadas poderão receber um novo público, gerar novas receitas para o mercado, sem esquecer do principal: eliminar as barreiras que ainda existem para que essas pessoas tenham o prazer único de frequentar e viver a experiência de uma sala de cinema.

*P.S.: Haja resiliência. O Senado Brasileiro aprovou em 27 de maio de 2021, Medida Provisória (MP) 1.025/2020, que prorroga até 1º de janeiro de 2023 o prazo para todas as salas de cinema do país oferecerem recursos de acessibilidade a pessoas com deficiências visual e auditiva. O texto, ainda, será encaminhado para publicação. Este já é o quarto adiamento da obrigatoriedade.

Joana Peregrino
Joana Peregrino

Sócia fundadora e Diretora-executiva da empresa Conecta Acessibilidade, atua há 21 anos no mercado de audiovisual e, desde 2012, vem trabalhando com acessibilidade audiovisual. Jornalista e Mestre em Educação, Gestão e Difusão em Biociências pela UFRJ, é autora do e-book “Acessibilidade em Cinema e Televisão”, produto de sua dissertação de mestrado que expõe os processos de produção da acessibilidade audiovisual no Brasil. Ganhou o Prêmio Direitos Humanos concedido pela Presidência da República em 2015 com o projeto da TV Ines, primeiro canal para pessoas surdas do país.

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