06 Junho 2025
Ir ao cinema é para além do hábito
Movimento constante em direção às salas demandada planejamento e ações especificas
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Repetir, repetir, repetir, até que a ação contínua se torne uma prática. Torne-se constante.
Esse caminho seguro configura uma ida, talvez não a volta. A frase “cinema é hábito” demonstra uma dissociação do processo relacional entre o público frequentador e a dinâmica do mercado exibidor, suas frentes e frestas. Quem vivencia o desafio de programar uma sala ou uma rede sabe o quanto as semanas são escorregadias e surpreendentes. A unicidade do termo público se faz tão desgastada quanto a definição de que cinema é hábito.
No Brasil, ir ao cinema soma-se às diferenças regionais e sociais, sobretudo. Fato que demanda planejamento e ações específicas que não sejam diluídas em meio a outras opções culturais, oscilações de mercado e demais alternâncias.
A inconstância é marca do recorte histórico no qual vivemos e apostar em um hábito, na disposição de agir da mesma forma movido por uma ação repetitiva destoa do que o cinema propõe. Ficando apenas na superfície, cinema é imagem e movimento. Assim sendo, a semântica é um dos pontos desta pensata.
O comparecimento de pessoas às salas passa longe de uma proposta de repetição, pois o audiovisual pressupõe pensamento crítico, independente do gênero do filme. Rituais existem na ida ao cinema, mas estes, também, são mutáveis, servindo como atração ao público. O ritual é um meio, não um fim em si mesmo. Diversão e entretenimento não estão apartados de criticidade e das experiências derivadas da sala escura desde os irmãos Lumière.
Estar ciente do caminho feito até as salas – o que me levou a escolher esse filme e não outro -, é fundamental para que as pessoas sigam desejando compartilhar estes locais para assistir aos filmes semanalmente e não movidas, primordialmente, por efemérides – premiações, promoções -, as quais perdem o fôlego na programação regular. A exibição de trailers in loco é tão efetiva enquanto as pessoas escolhem seus lugares ou aproveitam o último momento de scroll no celular?
O hábito do acesso
Garantir a presença de indivíduos para uma experiência coletiva de forma sustentável e constante tangencia a garantia de acesso descentralizado nestes espaços de exibição, dos independentes aos comerciais -, devem ser confortáveis e atraentes, construindo uma dinâmica central entre a programação, as salas e o espaço geográfico ao redor.
Formar públicos é uma das pecinhas, ao menos a tentativa de encaixe diário na cine semana e a combinação delas traz resultados inesperados. Por isso, necessitam de ações planejadas na versatilidade e mobilidade; na informação e reformulação para que os erros e acertos sejam ambos entendidos como oportunidades.
O imprevisível faz parte do jogo, revelando o dinamismo de se construir espaços de exibição mesmo em contextos inconstantes.

Márcia Scapaticio
Jornalista e mestranda em Estudos Culturais pela USP, trabalha com cinema há 10 anos, atuando em crítica e curadoria, internacionalização do cinema brasileiro em mostras/festivais, editais, difusão audiovisual em streaming e programação.
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