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25 Agosto 2020 | Fernanda Mendes e Marcelo Lima

Setor questiona adiamento da reabertura dos cinemas

Nas principais praças do circuito brasileiro, as salas permanecem fechadas há cinco meses

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(Foto: iStock)

Desde que as prefeituras das duas principais cidades para o circuito exibidor brasileiro, São Paulo e Rio de Janeiro, decidiram adiar a data prevista para a reabertura dos cinemas, surgem muitas dúvidas sobre as justificativas para tal decisão e quais serão as implicações que esse adiamento pode acarretar no mercado cinematográfico nacional.



Há cinco meses fechados devido à pandemia de Covid-19, os cinemas estão lutando contra o tempo, para manterem os salários de seus funcionários, manutenção dos equipamentos, aluguel, e muitas outras contas que batem à porta, mesmo sem faturar nada.

No Estado de São Paulo, o governador João Dória (PSDB) autorizou a reabertura dos cinemas para as cidades que se encontram há mais de 20 dias na Fase Amarela e com boa evolução, seguindo o Comitê de Contingenciamento do Coronavírus do Estado. No entanto, o prefeito da capital do Estado, Bruno Covas (PSDB), não acatou a orientação e anunciou que os cinemas, museus e teatros do município só poderão reabrir na Fase Verde de retomada das atividades comerciais. Fase que está prevista para entrar em vigor no fim de setembro ou início de outubro.

No Rio de Janeiro a mesma situação se repete. Após o governador Wilson Witzel (PSC) autorizar a reabertura dos cinemas, a capital fluminense prevê a retomada do setor apenas na Fase 6, que foi adiada em 15 dias.

Uma das principais reivindicações dos exibidores é de que outros estabelecimentos como restaurantes, igrejas e supermercados – ambientes fechados e com ar-condicionado igualmente – já estão operando.

Paulo Lui, proprietário da rede Topázio Cinemas de Indaiatuba (SP), comentou com o Portal Exibidor sobre sua indignação diante das autoridades, pois a prefeitura de SP seguiu as orientações do Governo para reabrir tantos outros setores, mas o mesmo não aconteceu para os cinemas. “O cinema é um dos lugares onde mais se pode controlar o fluxo de pessoas (lugares são marcados: vendeu a ocupação definida, a venda é encerrada), distanciamento social (através de marcações idênticas às que são usadas em supermercados, farmácias, bancos, terminais urbanos), a não-interação entre o público - pessoas assistindo um filme não conversam, ficam quase duas horas paradas numa mesma posição, ao contrário de bares e restaurantes, onde a interação é enorme, entre os comensais e os funcionários; ao contrário de bancos, supermercados, onde todos se esbarram a todo tempo; ao contrário de igrejas onde se entoam cantos, orações, benzimentos, etc”.

Na visão dos fornecedores da exibição cinematográfica, Luiz Morau, diretor do grupo QUANTA, também explanou sua preocupação sobre os cinemas permanecerem fechados, enquanto bares e igrejas estão operando. "Os empregos nestes estabelecimentos são mais dignos ou imprescindíveis que os de um complexo de cinema? Se observarmos os fatores principais, que definem as atividades de maior risco, chegaremos a conclusão que algo está errado na proibição da abertura das salas de cinema e a liberação dos templos religiosos", lamenta.  

Em Cuiabá, Mato Grosso, o retorno dos cinemas também foi adiado pela prefeitura. Ao mesmo tempo, o município autorizou a realização de eventos sociais com até 100 pessoas e de eventos corporativos com até 200 participantes. “Cinemas e teatros são atividades que geralmente ocorrem em locais fechados, com ar-condicionado, que envolvem aglomeração de pessoas, facilitando a troca de secreções respiratórias diversas, dispersão de aerossóis, o que favorece a proliferação do coronavírus, cujo combate é o foco da gestão municipal, neste momento”, alega a nota oficial da prefeitura.

Aliás, essa questão do ar-condicionado está sendo esclarecida por diversos players do mercado e infectologistas. John Fithian, presidente da NATO (National Association of Theatre Owners) nos EUA, explicou em evento na última semana sobre o ar-condicionado dentro de um multiplex: “Geralmente, um multiplex de seis salas terá oito sistemas de ar-condicionado, então a ideia de que o COVID-19 seria transmitido de uma sala para outra não é baseada em fatos”.

Lui também falou sobre o assunto: “A grande maioria não deve saber, mas o ar-condicionado desses lugares que recebem público (como teatros, cinemas, salas de concerto, casas de show, etc.) tem que, obrigatoriamente por lei, fazer a renovação automática do ar, como se tivesse portas ou janelas fazendo a troca do mesmo”. O exibidor ainda ressalta que esses estabelecimentos são obrigados a ter o PMOC (Plano de Manutenção, Operação e Controle), também regido por lei, a de número 13.589/18.

Além da limpeza já habitual do sistema de ar-condicionado, o protocolo de segurança para os cinemas na capital paulistana também propõe a utilização do filtro Hepa (High Efficiency Particulate Air) sempre que não for possível garantir a ventilação natural.

Durante o mesmo evento com John Fithian nos EUA, o epidemiologista da Universidade de Washington, Dr. David F. Goldsmith, alertou inúmeras vezes de que não existe um ambiente livre de riscos. No entanto, em sua revisão da literatura de medicina não encontrou nenhuma evidência de contágio de COVID-19 relacionado a cinemas.

Já em igrejas e restaurantes, o epidemiologista adverte que são locais onde há comprovação de contágio coletivo. No cinema, ele acrescentou, o fato de os espectadores se sentarem e olharem para a mesma direção e não falarem ou cantarem por longos períodos é uma vantagem.

Em matéria veiculada na Folha de S. Paulo na semana passada, Marcio Sommer Bittencourt, médico do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo, afirmou que o risco de contágio em espaços culturais é o mesmo de qualquer outro ambiente com as mesmas características arquitetônicas.

O problema, segundo o médico, seria a questão de volume de pessoas em um ambiente fechado, o que proporciona um maior risco de contágio. No entanto, esse fator pode ser contornado, pois para a reabertura, os cinemas precisarão receber menos espectadores (40% da capacidade da sala tem sido a média solicitada pelos protocolos dos governos locais), e garantir o distanciamento de 1,5m entre os espectadores.

Esse é só um dos diversos novos processos que os cinemas estão preparando para receberem os espectadores quando puderem reabrir. Tudo está sendo pensado há meses por diversas cabeças. E, por isso mesmo surgiu o movimento #JuntosPeloCinema que, além de criar uma campanha de marketing integrada nacionalmente para o retorno das salas, há grupos de trabalho que pensam especificamente na questão da saúde e segurança dos espectadores e funcionários, e grupos para traçar a estratégia de comunicação com os clientes. O movimento conta com 200 profissionais da indústria cinematográfica, de todas as partes do país.

Uma das maneiras de comunicar ao público sobre os protocolos de segurança que estão sendo tomados para a prevenção do Covid-19, é o certificado digital. “Os cinemas estão aplicando todos os protocolos definidos pelas autoridades sanitárias, e estão prontos para operar com segurança. Contudo, é preciso que o público saiba disso, e a certificação, além de ser extremamente eficiente do ponto de vista técnico, também é uma forma de mostrar que os cinemas são ambientes limpos e seguros”, afirma Paulo Lui.

Um dos certificados do mercado é o Selo ALS (Ambiente Limpo e Seguro), implantado pela ICV Brasil. A certificação, realizada de forma remota, a partir de uma plataforma própria de captura e envio das imagens digitalmente, faz a auditoria se os cinemas estão cumprindo requisitos como a redução da capacidade de público para 40% para evitar aglomeração; a limpeza das poltronas e braços entre as sessões; o intervalo maior entre os filmes; a disponibilidade de álcool em gel 70%; o controle de temperatura de clientes e colaboradores; o distanciamento das pessoas em filas e os sistemas de ventilação e climatização limpos, entre outros pontos.

E caso as pessoas detectem alguma irregularidade ou vulnerabilidade na segurança, podem entrar diretamente em contato com a certificadora.

Impacto no setor

A incerteza de quando as salas reabrirão nas principais praças do país só gera um efeito dominó no setor cinematográfico. “Uma cadeia que está totalmente parada e sujeita a ter salas fechadas diminuindo ainda mais o pequeno número de salas existentes e gerando mais desemprego”, lamenta Charles Freitas, programador da Centerplex Cinemas.

Atualmente com 3.500 salas de cinema no Brasil, alguns empreendimentos já fecharam e outros podem não aguentar muito mais tempo parados. Outro desafio é o agendamento dos lançamentos dos filmes.

Com as incertezas sobre a reabertura das salas, os distribuidores não conseguem agendar seus lançamentos, deixando as salas de cinema que já puderam reabrir, sem filmes inéditos. “Os cinemas que já estão abertos sem filmes novos não vão ficar muito tempo abertos e fecharão novamente devido à falta de produto”, conta Flávio Canteruccio, que ainda avalia os prós e contras em deixar seu cinema de Ubatuba, litoral norte paulista, aberto sem lançamentos.

Em seu recente artigo assinado para o Portal Exibidor, Ricardo Difini Leite, presidente da FENEEC (Federação Nacional das Empresas Exibidoras Cinematográficas) e diretor do GNC Cinemas, no sul do país, reforça que “quando aplicados os devidos protocolos de proteção, a exibição de filmes dentro de salas de cinema tende a ser mais segura que várias outras atividades da economia”.

“Trabalhamos incansavelmente para prepararmos nossos cinemas neste tão esperado momento da retomada de nossa atividade, para podermos voltar a oferecer aquilo que mais gostamos de fazer: proporcionar momentos felizes e uma experiência única aos nossos clientes, sempre pensando na sua segurança e bem-estar. A população também precisa de diversão”, finaliza.

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