04 Novembro 2025 | Yuri Cavichioli
Outubro de 2025 encerra com retração e reforça desafios do mercado exibidor
Sem grandes lançamentos de apelo forte e diante de uma mudança no comportamento do público, o mês se tornou o mais fraco desde 2020
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Os resultados de outubro passado apontam para um olhar de bastante atenção. Com uma queda de 43% de público em relação ao mesmo período do último ano, outubro de 2025 mostrou-se um recorte temporal difícil para os envolvidos no ecossistema cinematográfico — à frente apenas de 2020, ano em que tivemos o lockdown, por conta da pandemia. É verdade que o mês passado não contou com lançamentos de grandes blockbusters, diferente do mesmo período em 2024, quando o comparativo direto foi com: Coringa: Delírio a Dois, Venom 3: A Última Rodada e Robô Selvagem, ajudando o mês a bater 9,82 milhões de público no Brasil, contra os 4,94 milhões de bilhetes vendidos deste ano, segundo dados do Observatório do Cinema e do Audiovisual da Ancine.
Em um olhar rápido das principais estreias de outubro e filmes remanescentes de setembro, tivemos Perrengue Fashion (Downtown/Paris), Tron: Ares (Disney), O Telefone Preto (Universal), A Casa Mágica da Gabby (Universal) e Invocação do Mal 4: O Último Ritual (Warner), que juntos fizeram pouco mais de 2,3 milhões de público no período. Todos foram os responsáveis por elevar os números de bilhetes vendidos no Brasil.
Mesmo em mais um ano em que um filme ultrapassou a marca dos US$ 1 bilhão nas bilheterias globais, o mercado cinematográfico atravessa um período de instabilidade. A retomada pós-pandemia trouxe novos hábitos de consumo, e a experiência coletiva — antes uma marca do cinema — disputa espaço com formas de entretenimento cada vez mais individualizadas. O resultado é um cenário de contrastes: franquias que quebram recordes isoladamente e salas que ainda lutam para reconquistar o público.
Voltando dez anos no tempo, em 2015, o cenário de outubro era de pouco mais de 13 milhões de pessoas presentes no cinema. Como outubro de 2025 amargou menos de 5 milhões de público total — e deixemos de lado 2020, onde as salas estavam infuncionais —, é um sinal de alerta que deve ser observado por todos da cadeia do setor. Resultado: uma queda acentuada de mais de 62% nos espectadores em uma década.
A ausência de público nos cinemas em outubro não possui uma única resposta. Entretanto, podemos destacar que diversos segmentos do entretenimento out of home apresentaram queda de receita em outubro; é o que demonstra o os dados de 2023, do Relatório Covitel, como citou o G1 recentemente.
E as inovações tecnológicas, alinhadas à popularização das smart TVs e maior penetração de internet com qualidade no Brasil, aponta para os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) onde mostram um crescimento acelerado desse tipo de acesso, que passou de 11,3% em 2016 para 32,2% em 2019, chegando a 53,5% em 2024. Isso demonstra que, à medida que o brasileiro foi ficando mais em casa, foi assistindo mais televisão e consumindo mais streaming. O que pode ter ocasionado em preterir o deslocamento ao cinema, pelo sofazinho de casa. Apesar de serem dados referentes a 2024 e anos anteriores, ajuda a explicar o comportamento do público nos últimos anos - e no mês passado - em relação ao consumo de audiovisual.
E por falar em fidelização, outro ponto é geracional. Não se trata aqui de culpar grupos etários na forma como eles se comportam, mas de discutir a formação de público - como foi abordado na EXPOCINE 25, ainda no início de outubro. Criar o hábito de sair de casa e, mais precisamente, de ir ao cinema, tornou-se um desafio. A individualização do consumo de conteúdo se tornou a antítese da experiência coletiva. O cinema não “briga” mais apenas com a televisão e entretenimento out of home pela atenção do público. Há diversos formatos de conteúdos, presentes em TikTok, Instagram e YouTube, para concorrer com a telona. O estudo da Bain & Company indica que o brasileiro fica, em média, mais de 3 horas nas mídias sociais por dia. Isso corrobora que quem tem de fato captado consideravelmente a atenção cotidiana do brasileiro são os aplicativos de smartphone em detrimento às mídias tradicionais.
A queda na frequência às salas, a dispersão do público e as novas dinâmicas de entretenimento pós-pandemia desenham um retrato ambíguo da indústria, onde temos um setor em que o sucesso de um grupo de filmes não garante a saúde de todo o ecossistema.
Segundo dados do OCA, o público geral do Sudeste em outubro de 2025 foi cerca de 70,9% menor que no mesmo período de 2019 — ou seja, o volume de espectadores de seis anos atrás foi aproximadamente 3,4 vezes maior. Algo não muito distante, mas vemos uma queda menor no Nordeste, onde o público registrado em outubro deste ano foi de 788,8 mil pessoas, contra 2,2 milhões em 2019, uma queda de cerca de 64%.
Esses números ajudam a dimensionar um fenômeno que não se restringe regionalmente. A retração no público das salas dialoga diretamente com as flutuações da bilheteria mundial e com uma nova lógica de consumo.
Entre bilheterias bilionárias e salas quase vazias, quem olha os meganúmeros de cada um dos últimos dez anos, pode não imaginar que o cinema vive uma constante readequação aos “novos tempos” de estratégias de exibição e marketing. Aliás, o cenário de instabilidade que o mês de outubro apresentou não vale apenas para o Brasil, com demais territórios procurando por momentos melhores. Nos Estados Unidos, aliás, outubro fechou com a pior arrecadação dos cinemas no Halloween dos últimos 31 anos.
Em 2025, o chinês Ne Zha: O Renascer da Alma (A2 Filmes) ultrapassou US$ 2,2 bilhões e se tornou a maior animação da história. A questão, portanto, não é a ausência de grandes sucessos de bilheteria — mas a concentração deles em poucos títulos e mercados.
A título de comparação entre as que mais faturaram pelo mundo, em 2019 o longa Vingadores: Ultimato foi o primeiro da lista, onde atingiu quase US$ 2,8 bilhões de bilheteria. E o último da lista do top10 foi Velozes e Furiosos 9, que atingiu a marca de US$ 758 milhões. Já em 2024, quem se destacou foi Divertida Mente 2, com aproximadamente US$ 1,6 bilhão em bilheteria, e quem ficou em décimo colocado foi Sonic 3 - O Filme, atingindo pouco mais de US$ 492,1 milhões em bilheteria.
Números que demonstram um certo declínio quando olhamos o número geral — o que reflete nos demais, abaixo dos “top10”. Segundo o Box Office Mojo, também mostra que no período de 2015 a 2019, o número total de bilheteria no mundo ficou entre US$ 36 bilhões e USS$ 39 bilhões. A partir da pandemia, os números foram de US$ 8,6 bilhões em 2020; US$ 19,5 bilhões em 2021; US$ 22,7 bilhões em 2022; US$ 28,2 bilhões em 2023 e US$ 24,7 bilhões em 2024. Até aqui, neste ano, temos US$ 17,9 bilhões arrecadados pelo mundo.
E o que explica essa oscilação? Filmes como Superman (Warner) e Quarteto Fantástico: Primeiros Passos (Disney) fizeram bons números, US$ 615 milhões e US$ 521 milhões respectivamente. Mas, em outro tempo, na consolidação das três primeiras fases da Marvel, um número próximo a meio bilhão em bilheteria não soaria tão positivamente. Isso demonstra também um novo olhar, alinhado ao momento até para os filmes de super-heróis, ainda um dos detentores dos holofotes da indústria.
Esses resultados de grandes títulos que não viraram “evento” e uma arrecadação global ainda longe dos níveis pré-pandemia forçam uma mudança de perspectiva: não se trata apenas de produzir filmes maiores, mas de repensar como e por que o público decide sair de casa.
É importante salientar que o mercado cinematográfico não está parado. As distribuidoras e exibidoras vêm se movimentando para se adequarem às novas demandas do mercado, com tentativas de modernização na forma de comunicar, explorar eventos e criar experiências presenciais que façam sentido em meio a tantas opções digitais. A busca por formatos híbridos, ativações em rede e campanhas integradas mostra que há mobilidade, e que o desafio está em reconstruir o hábito, não apenas o público.
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