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05 Janeiro 2024 | Yuri Codogno

Retrospectiva 2023: os principais acontecimentos do ano no mercado cinematográfico

Questões políticas, maior arrecadação global no pós-pandemia e paralisações estão entre os destaques

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(Foto: Divulgação)

O ano de 2024 começou, mas muito do que veremos nos próximos 12 meses será reflexo de um 2023 bastante complexo. Da alta expectativa de uma forte retomada, com títulos que conseguiram surpreender ao arrecadar mais do que o esperado - e ocasionando na maior bilheteria global desde o início da pandemia -, a realidade se apresentou com diferentes planos, com greves, baixas arrecadações de filmes que no passado eram garantia de sucesso, entre outras questões - positivas e negativas - que balançaram o mercado para ambos os lados. 

Desta forma, há muitas coisas positivas, mas também negativas, para destacar sobre o mercado cinematográfico de 2023. Confira a retrospectiva completa!




Política

De certa forma, o ano de 2023 começou ainda antes de 2022 terminar - ao menos no Brasil. Isso porque, com a vitória de Lula (PT) na eleição presidencial, o Ministério da Cultura foi recriado com Margareth Menezes aceitando o convite para ser ministra e, poucos dias após a posse, foi a vez de Joelma Gonzaga aceitar o convite para comandar a Secretaria Nacional do Audiovisual

De lá para cá, alguns aportes foram liberados para o setor cultural - em especial o audiovisual -, com o objetivo de auxiliar na retomada cultural do país. Entre esses investimentos, estão R$ 1 bilhão da Ancine, R$ 2,7 bilhões da Lei Paulo Gustavo e R$ 1,2 bilhão do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). 

No estado de São Paulo, também houve mudanças no governo, com Marilia Marton assumindo a Secretaria de Cultura, Economia e Indústrias Criativas do Estado de São Paulo. Em entrevista exclusiva ao Portal Exibidor, inclusive, a secretária ressaltou que governos passam, mas políticas de estado ficam

Contudo, apesar dos investimentos, os exibidores tiveram algumas ressalvas, sendo duas delas as principais. A primeira é sobre algumas possíveis distorções na regulamentação da Lei Paulo Gustavo para as salas de cinema, algo que o MinC rechaça e ressalta que a regulamentação foi realizada de forma participativa

A outra questão, mais recente, se refere às dificuldades que os exibidores enfrentam para poder arcar com os custos do empréstimo do FSA designado para auxiliar os cinemas a sobreviverem durante a pandemia, visto que a exibição nacional, apesar de ter melhorado em relação ao ano anterior, não se recuperou ao ponto de conseguir honrar os vencimentos.

Quem também deu às caras e sofreu grandes reviravoltas em 2023 foi a cota de tela para o cinema nacional. No final de agosto, após meses de discussão sobre o assunto, o Senado retirou o cinema do texto final do Projeto de Lei 3696/2023, mantendo apenas a cota de tela para televisão. Os players cinematográficos, especialmente os setores de distribuição e produção, reagiram à decisão, criticando-a. 

Mas no apagar das luzes de 2023, foi recriado o Projeto de Lei para a cota de tela nacional para os cinemas, que ainda irá para sanção presidencial. Entretanto, é importante ter em mente que, sozinha, a cota de tela não faz milagres e que são necessárias medidas complementares para alavancar a produção nacional. Além, é claro, de auxiliar os exibidores, visto que as produções internacionais representaram mais de 95% das vendas de ingressos no país, sendo disparadamente a principal receita das redes exibidoras em 2023.  




Exibição e bilheterias

Na exibição e nas bilheterias como um todo, 2023 foi um ano de altos e baixos. Assim como na política, que suas grandes novidades começaram ainda no ano anterior, nas salas de cinema também foi assim. Isso porque Avatar 2: O Caminho da Água (Disney) ainda estava em cartaz, visto que foi lançado em dezembro de 2022. Desta forma, boa parte de sua arrecadação aconteceu nas primeiras semanas de 2023 e o filme terminou sua campanha com US$ 2,320 bilhões arrecadados, se tornado a terceira maior bilheteria global da história. 

Ainda sobre o filme, ele conseguiu uma raríssima extensão de exibição na China, visto que o país permite que produções estrangeiras fiquem em cartaz durante períodos de 30 dias. Com isso, Avatar 2 ficou disponível para o público chinês em um total de 60 dias, permanecendo em exibição durante o feriado do ano novo chinês, momento em que muitos dos principais lançamentos nacionais estreiam. 

Depois, vários filmes conseguiram liberação de voltar a serem exibidos na China, normalizando a situação local - com algumas exceções que são proibidas de serem exibidas no país. E vale lembrar: o impedimento de muitos filmes estrangeiros não irem às telonas chinesas não é apenas uma mera questão política de uma guerra-fria cinematográfica; trata-se de valorizar o cinema nacional, tanto que o cinema chines arrecadou quase US$ 8 bilhões em 2023 - com as maiores bilheterias sendo de filmes nacionais -, algo surpreendente para um país que em 2022 passou pela pior parte da pandemia. 

A América do Norte, por sua vez, teve seu melhor ano pós-pandêmico, arrecadando pela primeira vez acima dos US$ 9 bilhões. Como ressaltamos, há duas maneiras de observar isso: o copo meio cheio ou o meio vazio. Mas, de qualquer jeito, é uma marca importante na indústria cinematográfica, especialmente por ter sido um ano com talvez as principais greves da história recente de Hollywood. 

O Brasil, enquanto isso, comemorou um aumento de quase 25% no público em 2023, em relação ao ano anterior. Antes mesmo do ano acabar, ao final do primeiro semestre, o país já havia aumentado, também em 25% as vendas de ingressos. A má notícia, entretanto, é que os filmes brasileiros representaram apenas 2,47% do market share da venda de ingressos no país, impedindo que a recuperação do setor no Brasil pudesse ser ainda maior. No final das contas, Nosso Sonho (Manequim Filmes) foi o longa nacional mais visto, com 500 mil ingressos vendidos.

Já a arrecadação mundial continua em uma crescente e ano passado obteve um aumento de 31%, em comparação com 2022. Para isso, alguns filmes alcançaram números que, antes da estreia, talvez não fossem os mais esperados. 

Como ressaltamos durante o ano passado, títulos que antes eram garantia de ingressos vendidos não conseguiram desempenhar tão bem, como os dos universos cinematográficos da Marvel e DC. Com uma exceção ou outra, os grandes destaques foram os longas que não pertenciam à nenhuma franquia. 

Um deles foi Super Mario Bros - O Filme (Universal), que também foi o primeiro longa lançado em 2023 a alcançar US$ 1 bilhão global, terminando sua campanha com US$ 1,36 bilhão arrecadados.  

Mas quando falamos de bilheteria em 2023, é difícil não citar o Barbieheimer, que mesmo antes das estreias de Barbie (Warner) e Oppenheimer (Universal), já estava aquecendo o mercado de exibição global, com vendas antecipadas quebrando recorde. O resultado não foi outro: Barbie se tornou - e manteve o posto até o final do ano - a maior abertura e maior bilheteria de 2023 (US$ 1,44 bilhão), enquanto Oppenheimer quase chegou ao bilhão arrecadado (US$ 952 milhões). Os dois filmes juntos, vale lembrar, fizeram com que a arrecadação global de julho conseguisse superar a média obtida nos anos pré-pandêmicos

E esses três filmes deixaram bem claro uma mensagem: o público está fatigado de tantos lançamentos e de ser obrigado a acompanhar franquias, o chamado burnout do entretenimento. Como ressaltaram Marcelo Forlani e Aline Diniz durante um painel da Expocine sobre o mesmo tema, em relação a quando uma saga chega a seu limite: “é que nem sexo, quando chega no clímax, não dá para superar”

Super Mario, Oppenheimer e Barbie foram, de fato, os grandes filmes de 2023, não apenas pelo o que arrecadaram, mas pelo o que significaram. Entretanto, Barbie ainda leva algumas vantagens. Alguns exemplos: um estudo apontou que o filme da Mattel elevou o faturamento dos cinemas em quase 90%; e nos EUA, Barbie foi o primeiro filme visto nos cinemas por 25% dos espectadores desde o início da pandemia.

Mais do que isso, Barbie se tornou um case de sucesso da Mattel. Claro que toda estratégia da Warner foi importantíssima para o sucesso do filme e isso é inquestionável, mas o trabalho da Mattel por trás para valorizar o próprio produto foi algo inovador no mercado. “Branding é um verbo que deve ser conjugado em todos os canais de comunicação que a marca tem acesso. Então a Mattel fez uma grande estratégia de marca reposicionando o brinquedo Barbie para o século XXI”, explicou Koka Machado, professora de branded content e storytelling da ESPM e sócia-executiva do Grupo Sal, em entrevista ao Portal Exibidor.

Indo além, o filme passou um importante recado para a indústria de Hollywood, mostrando que o público quer mais filmes diversos, especialmente longas dirigidos por mulheres, pois há diversos públicos interessados nesse tipo de conteúdo. Além, claro, da importante questão de dar vozes às minorias sociais.

E sobre diversidade de conteúdo, 2023 mostrou que as telonas são um excelente local para se apreciar um show. Além de Renaissance: A Film by Beyoncé, que estreou no final do ano passado, o destaque ficou para The Eras Tour, da Taylor Swift, que quebrou recordes de vendas antecipadas e foi a 11ª maior arrecadação de 2023 na América do Norte. Ainda em 2022, um artigo da Gabriela Biscotto publicado no Portal Exibidor já havia cantado a bola sobre o encontro entre a indústria da música e do cinema





Streaming

Do outro lado do muro das exibições, os streamings também tiveram um ano atípico. Após 2022 ter abalado as estruturas das plataformas, com o alto número de assinantes perdidos pela Netflix, em 2023 essas empresas foram obrigadas a procurar novas soluções que possibilitassem a autossustentação das plataformas e, de grande preferência, a obtenção do lucro. 

No finalzinho de 2022, a Amazon havia anunciado um investimento de US$ 1 bilhão em produções cinematográficas, algo que foi seguido pela Apple posteriormente. Esse movimento, por si só, demonstra um certo reconhecimento de como os cinemas são o principal meio de arrecadação para as distribuidoras. 

Mas dentro das plataformas, a primeira grande sacada do ano foi da própria Amazon, dona da Prime vIdeo, que anunciou uma divisão de distribuição para comercializar o próprio conteúdo original com outros streamings. Com cada estúdio abrindo sua própria plataforma, as empresas perceberam que era mais difícil manter os assinantes, visto que os filmes e séries começaram a se descentralizar, obrigando o público a optar por uma ou outra assinatura. 

Dessa forma, os streamings observaram que seria necessário fazer um caminho reverso e começaram a pensar em estratégias de um passado não tão distante, quando era comum licenciar seus conteúdos originais para empresas concorrentes do mercado. Ainda é cedo para observar se o novo-velho planejamento está funcionando ou não, mas é um movimento que não se pode ignorar. 

Pouco depois, foi a vez da Netflix cumprir uma antiga promessa: a cobrança extra pelo compartilhamento de tela. E o inesperado aconteceu: aumentou e continua aumentando seus assinantes. No Brasil, entretanto, o Procon foi acionado, declarando que seria uma cobrança abusiva. De qualquer forma, outras empresas seguirão por esse caminho, como o Disney+.

Fechando o assunto streamings, o ano começou revelando que oito em cada dez consumidores se sentem sobrecarregados com o alto número de plataformas no mercado. Bom, o ano terminou com a promessa de alguns a menos, visto que a Lionsgate+ (ex-Starzplay) ficará, por tabela, dentro da Prime Video, enquanto o Star+ será absorvido pelo Disney+.




Greve dos roteiristas e dos atrizes/atores

No geral e mesmo entre altos e baixos, o ano se encaminhava para uma boa recuperação no setor cinematográfico - maior do que os números apresentados -, até as greves dos roteiristas e das atrizes e atores de Hollywood se concretizarem. 

Em um primeiro momento, o WGA (sigla para o Sindicato de Roteiristas dos EUA) entrou em greve no dia 2 de maio, após não chegar a um acordo com o AMPTP (Aliança dos Produtores de Cinema e Televisão). As maiores divergências estavam na utilização da Inteligência Artificial e nos valores reivindicados pelo sindicato que, se comparado com a receita média de todos os estúdios, foi uma exigência que era de apenas 0,0262% do faturamento médio das majors e principais streamings.

Dois meses depois, em 14 de julho, foi a vez do sindicato dos atores (SAG-AFTRA) anunciar as paralisações, fazendo com que Hollywood enfrentasse pela primeira vez em seis décadas uma greve conjunta entre ambas as categorias. As reivindicações, por sua vez, foram semelhantes às do WGA, com uma grande briga contra a I.A., pois os estúdios queriam, através dela, utilizar os rostos dos atores para sempre. Além disso, um abismo de US$ 480 milhões impedia o acerto entre SAG-AFTRA e AMPTP.

Enfim, ambas as greves se encerram: a dos roteiristas em 27 de setembro, após 148 dias de paralisação; e a dos atores em 9 de novembro, depois de 118 dias de negociações. Ambos os casos foram considerados um sucesso pelos grevistas e sindicatos, que comemoram a vitória. O DGA (sindicato dos diretores), por sua vez, não entrou em greve, alcançando o que queria nas negociações iniciais. 

Em todo caso, as consequências das paralisações serão sentidas durante todo o ano de 2024, que deve ter uma diminuição na arrecadação anual em comparação com 2023. Em tempo, vale citar: ambas as greves foram legais, de grupos que há anos não conquistavam melhores condições de trabalho.




Premiações

O ano começou com algo, se não incomum, atípico: três das principais premiações do mundo tiveram diferentes vencedores na categoria de Melhor Filme. Enquanto o BAFTA premiou Nada de Novo no Front (Netflix), o Globo de Ouro escolheu Os Fabelmans (Universal) e o Oscar surpreendeu (mas nem tanto) ao dar o prêmio máximo para Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo (Diamond Films).

Conceitualmente, o Oscar não costuma premiar como Melhor Filme uma produção com uma pegada que lembra a de um blockbuster (apesar do filme ser independente, por seu orçamento). Tal escolha fez o mercado questionar se essa movimentação seria uma tendência ou se foi algo por acaso. A resposta saberemos na próxima edição, em março.

No Brasil, as duas principais premiações do mercado também foram para os caminhos opostos. Enquanto no Festival de Gramado o longa Mussum - O Filmis (Downtown/Paris) foi o grande vencedor, no Prêmio Grande Otelo do Cinema Brasileio (ex-Grande Prêmio do Cinema Brasileiro) o selecionado foi Marte Um (Embaúba Filmes).




Eventos 

Por fim, o ano de 2023 também foi forte para os eventos do mercado de cinema. O Portal Exibidor se fez presente em alguns deles e a cobertura completa pode ser lida nos links a seguir:




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